De vendas durante lives à valorização da alimentação saudável, estudo aponta as dez principais tendências da China após reabertura
"O estudo foca no período de 60 dias após a reabertura e foi conduzido entre 2 de abril e 15 de junho sob um cenário de retorno ao trabalho e ao consumo. “Ao longo da coleta de informações, identificamos 10 tendências de comportamento do consumidor e mudanças econômicas registradas na China que, possivelmente, se replicarão em algum grau nos demais países que deixarem a quarentena, como o Brasil”, relata Felipe Zmoginski, CEO da Inovasia.
Para consolidar as tendências, a pesquisa se baseou em três fontes de informação. A primeira são os dados públicos disponibilizados pelo Escritório Nacional de Estatísticas da China, organismo que consolidou dados da retomada da economia no país. Junto a eles, somam-se pesquisas de entidades privadas que também apresentaram seus balanços durante a pandemia. Por fim, a consultoria também realizou entrevistas in loco com especialistas, tais como acadêmicos e economistas, para validar as tendências encontradas.
"Segundo Zmoginski, esses comportamentos são encontrados com mais força nas cidades da costa oriental da China, tais como Pequim e Xangai – o que indica que, no Brasil, os grandes centros urbanos serão mais impactados. "Quem está bem informado e percebe essas tendências tem mais chance de se organizar para atravessar a crise", aponta. Confira abaixo as dez tendências encontradas pela pesquisa:
10 tendências de consumo do mundo pós-pandemia
1) Transmissões ao vivo como local de vendas
Imagine que um chef famoso faz uma live pelo canal de um supermercado e, ao longo da receita, você pode comprar os mesmos ingredientes que ele usa e tê-los em casa em poucos minutos. Essa estratégia foi largamente utilizada pelo HeMa, supermercado do grupo Alibaba referência em delivery no país.
A venda atrelada às lives é prática comum na China desde 2015, mas aumentou durante a quarentena. O estudo mostra que, segundo o instituto iiMedia Research, esse mercado movimentou US$ 63 bilhões no país em 2019, número que deve passar para US$ 135 bilhões em 2020. Além disso, 526 milhões de chineses viram transmissões de e-commerce por streaming durante a quarentena - o equivalente a 69% dos cidadãos chineses com acesso à internet.
No Brasil, algumas redes de varejo já realizaram ações similares mas, segundo Zmoginski, as transmissões ao vivo devem em breve se consolidar como um canal permanente de vendas.
2) Delivery em até uma hora
Conhecido por "same hour delivery", as entregas realizadas em até uma hora passaram a ser uma exigência dos consumidores, que não desejam voltar às filas de supermercados. Esse foi um dos fatores que levou o a rede HeMa a ter, em média, 1 milhão de novos registros por dia no seu aplicativo.
A pesquisa aponta que essa tendência teve impacto até no mercado imobiliário, com regiões de Pequim, Xangai e Shenzhen inseridas dentro dos perímetros de same hour delivery sendo valorizadas em até 10%, segundo análise da Real Capital Analytics.
"O aluguel subiu em regiões bem servidas por entregas rápidas porque as pessoas querem estar onde elas podem contar com o delivery rápido. No Brasil, o same hour é mais modesto por questões de infraestrutura, mas é claramente um desejo do consumidor. Se eu sou empreendedor e faço marketing em cima disso, certamente tenho um diferencial com relação aos competidores", relata o CEO.
3) Serviços sem contato
Quanto menos contato físico e atividades presenciais, melhor. Equipamentos para medir sinais de saúde, smartphone 5G e dispositivos de realidade virtual ou aumentada (RV/VA) foram alguns dos itens que tiveram alta no número de vendas - assim como as plataformas de aulas online, que cresceram na ordem de 600%.
Segundo a Nielsen, entre os produtos tecnológicos que os clientes mais planejam comprar no futuro estão os equipamentos RV/VA (47%), drones (42%), óculos inteligentes (41%) e jogos eletrônicos (38%).
4) Alimentação saudável e fitness
Na China, foi verificada uma alta no investimento em alimentação saudável e produtos fitness. Isso inclui, por exemplo, alimentos frescos em vez de congelados. O estudo aponta que 80% dos entrevistados prestam mais atenção à alimentação saudável e prestam mais atenção em rótulos das embalagens.
No entanto, essa preocupação com a saúde não significa necessariamente um crescimento de matrículas em academias, por serem lugares fechados com alto nível de contágio.
"Todo tipo de cuidado que pode ser oferecido à saúde das pessoas vai ser valorizado, e do ponto de vista econômico você vê esse aumento em todos os canais digitais - inclusive com a entrada de pessoas que não faziam parte do universo do e-commerce, os late adopters", aponta Zmoginski.
5) Carros pequenos e elétricos
Para quem pode optar, transportes coletivos estão sendo preteridos por veículos elétricos e menores pela menor chance de contaminação. Essa alta se dá, segundo a pesquisa, por uma ascensão de uma nova classe média chinesa com alto poder de compra, o que contribuiu para uma expansão da indústria automobilística.
Apesar de a venda de veículos ter caído 89% durante a quarentena segundo a associação chinesa de indústrias do setor, o consumo foi rapidamente retomado após a reabertura.
"É um dado triste, mas as pessoas vão evitar usar o transporte público se puderem, e formas alternativas de mobilidade vão ser valorizadas. Em vez do SUV, as pessoas estão buscando carros que andam a 40km/h, não ocupam tanto espaço e permitem que eu me desloque de uma forma mais individualizada", ressalta Zmoginski.
6) Checagem de notícias
Em contrapartida ao grande fluxo de propagação das fake news está a checagem de notícias. Para grande parte dos chineses, a pandemia teve como impacto positivo a importância de duvidar de informações compartilhadas em massa e de conferir suas fontes.
Em contrapartida ao grande fluxo de propagação das fake news está a checagem de notícias. Para grande parte dos chineses, a pandemia teve como impacto positivo a importância de duvidar de informações compartilhadas em massa e de conferir suas fontes.
Para Felipe, esta é uma das tendências mais fortes apresentadas na pesquisa, já que valem para qualquer localidade sem depender de infraestrutura. Ou seja: da capital ao interior, qualquer cidadão que receba uma fake news por WhatsApp pode duvidar do que foi recebido.
7) Força para o comércio local
Segundo Felipe, muitos indivíduos passaram a optar por comprar perto de casa. "Eles fazem isso por duas razões. Primeiro, por solidariedade econômica, preterindo o grande pelo pequeno. Segundo, como forma de autopreservação, preferindo ir no mais perto porque tem menos aglomeração, não precisa de transporte e se expõe menos a risco", afirma.
Dados da iiMedia Research mostram que o número de chineses que passou a optar pelo comércio local passou de 19% para 38,6%. Além disso, 50,6% dos consumidores mudaram a sua preferência de artigos importados para os nacionais.
8) Pagamentos digitais
A China já é considerada a primeira sociedade cashless - sem dinheiro físico - do mundo, com mais de 850 milhões de cidadãos que fazem pagamentos por celular, sendo o Banco do Povo da China. Mesmo com índices altíssimos de adesão ao meio digital, o país apresentou ainda um aumento de 6% no número de usuários de pagamentos móveis.
Segundo o estudo da Inovasia, é consenso que empresas que aderirem aos pagamentos sem contato vão ter um diferencial com relação aos consumidores no período de reabertura econômica.
9) Late adopters permanecem online
Para quem ainda não tinha coragem de se enveredar pelas compras online, a pandemia deve ser um caminho sem volta. Conhecidos por late adopters, os consumidores que passaram a ter esse hábito não devem mais deixar de fazê-lo - 85% deles afirmou ter tido experiências positivas. Por isso, o futuro exige que os negócios estejam preparados para oferecer delivery.
"Na China, 95% dos vendedores que experimentaram delivery pela primeira vez dizem que vão continuar oferecendo. Até nos lugares mais precários do Brasil as pessoas estão se organizando para que o delivery possa acontecer", explica Felipe.
10) Retomada veloz no consumo, mas sem planos a longo prazo
Segundo Felipe, o desejo de celebrar a vida leva ao consumo por indulgência. "As pessoas pensam: 'eu já fiquei trancado em casa, já fiz tanto sacrifício que eu quero comprar um sapato, trocar o celular. Eu mereço fazer isso'. E essa é uma oportunidade pro varejo". Em pesquisa da Dentsu Aegis Network, dados mostram que mais de 60% das pessoas saíram para ir comer com os amigos, 55% foram ao salão de beleza e 52% investiram em produtos para se exercitar.
No entanto, o cenário muda quando se fala sobre planos de longo prazo, como financiar um carro, planejar o casamento ou financiar um imóvel. Cerca de 60% dos contratos imobiliários foram cancelados por conta da insegurança.
"O consumidor que pensa a médio e longo prazo não quer fazer investimentos agora. Ele precisa ter mais segurança com relação ao próprio emprego e família para voltar a tomar essas decisões. Eles voltam ao mercado de produtos de uso imediato, mas as pessoas sentem que não é hora de planejar o futuro. Está nublado é preciso ter uma visão mais clara", pontua Felipe.
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